“A brasileira tem mais dificuldade para entrar no mercado altamente qualificado”, diz pesquisadora
Reinaldo Rodrigues

“A brasileira tem mais dificuldade para entrar no mercado altamente qualificado”, diz pesquisadora

O DN Brasil conversou com a professora Andrea Oltramari, responsável pelo “Mapeamento da Diáspora Científica Brasileira em Portugal”, que será lançado em forma de livro ainda este ano. Com estudos no assunto há 30 anos, a acadêmica não viu com surpresa os dados e sugere medidas para tornar de mais fácil acesso o mercado de trabalho.
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A pesquisadora brasileira Andrea Oltramari investiga carreiras há mais de 30 anos, o que quer dizer que muita coisa não a surpreende. E o principal dado da última pesquisa que comandou, o “Mapeamento da Diáspora Científica Brasileira em Portugal”, também não a deixou surpresa. “As mulheres têm mais barreiras para se inserir no mercado de trabalho. As mulheres estão localizadas num padrão onde estão muito, muito menos na sua função e formação original”, conta ao DN Brasil a pesquisadora colaboradora do ISEG Research/SOCIUS, da Universidade de Lisboa.

Os resultados do relatório serão publicados em forma de livro ainda este ano, com apoio da Embaixada do Brasil. Além das barreiras adicionais que as mulheres enfrentam, há também o fator da idade. “A medida que você fica mais velha aqui em Portugal, que as brasileiras ficam mais velhas, há uma dificuldade maior de ingressar no mercado de trabalho”, destaca Andrea, que é também professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS). Ao mesmo tempo, ressalta que a questão da idade é um padrão de outros países.

O mapeamento realizado por Andrea, com apoio da bolsista Mariana Casarotto Martins, foi baseado em uma metolodogia que inclui entrevistas em profundidade. Foi nestas conversas que a professora ouviu diversas histórias que estão por trás dos números do documento acadêmico. “Muitas mulheres muito qualificadas mesmo estão servindo mesas aqui em Portugal, em trabalhos completamente diferentes da área em que estudaram”, destaca.

E isso vem desde a base, especialmente na carreira acadêmica. “No caso de estudantes do Brasil, via de regra é mais difícil publicar em Portugal e fora, porque a pessoa está ocupada em carreiras paralelas, com terem um segundo ou terceiro turno para se manterem”, explica. O conhecimento de Andrea sobre a realidade portuguesa não é nova. Há mais de 20 anos a professora realiza investigações e publicações no país, estando como colaboradora da Universidade de Lisboa desdesde 2018, paralelamente como docente da UFRGS.

“A brasileira tem mais dificuldade para entrar no mercado altamente qualificado”, diz pesquisadora
Mercado de trabalho: brasileiros altamente qualificados enfrentam barreiras em Portugal

E como resolver esta disparidade de gênero? A investigadora aponta vários caminhos, que começam “na paridade de salários, nas universidades, nos eventos”. Mas também precisa de mudanças estruturais na sociedade como um todo. “A sociedade que vai ter que se organizar. Porque enquanto a mulher ficar sobrecarregada e cuidar da casa, cuidar dos filhos, o homem sempre vai ter a vantagem no mercado de trabalho”, analisa.

Além dos relatos de dificuldade de acesso ao emprego altamente qualificado em Portugal, Andrea também identificou nas entrevistas relatos de preconceito contra as mulheres e sexualização das brasileiras. “Isso foi unanime. A subalterização do corpo da brasileira, sempre associada à sexualidade, além de micro violências e micro agressões são muito maiores entre as mulheres”, analisa. O que foi transversal em relação ao gênero foi a dificuldade para validação dos diplomas acadêmicos.

Ao DN Brasil, Ramiro Januário dos Santos, chefe do setor de Ciência e Tecnologia da Embaixada do Brasil em Lisboa, disse que “os Governos do Brasil e de Portugal mantêm diálogo multissetorial permanente para fomentar os mecanismos e instâncias de reconhecimento”. Ao mesmo tempo, destaca que “o instituto da autonomia universitária, em ambos os países, impede que os governos determinem, por tratado internacional, o reconhecimento automático de graus no ensino superior, à semelhança do que já foi feito para o ensino fundamental e médio”. Ainda segundo Ramiro, “espera-se subsidiar e sugerir linhas de ação às instâncias de diálogo bilateral da Cimeira Brasil-Portugal (que se reúne anualmente) para abordar os desafios identificados” no relatório.

A questão de gênero é uma das principais preocupações. “Um dos principais resultados do mapeamento é a presença significativa de cientistas mulheres (70% do universo do estudo). Esse dado — associado ao achado de que cerca de 40% dos respondentes declararam não trabalhar em suas áreas de formação — leva à constatação de que há uma situação de subutilização de competências, em especial de pesquisadoras, a qual importa enfrentar”, detalha.

O relatório em livro terá dados ainda mais detalhados, como regionalidades, salários por área e saúde mental. A previsão é que seja publicado ainda este ano. O mapeamento também teve apoio da Universidade do Minho e da Unicamp.

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Este texto está publicado na edição impressa do Diário de Notícias desta segunda-feira, 18 de agosto de 2025.
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