"Viemos roubar vossos maridos": peça teatral criada por brasileiras explora história das mães de Bragança
Inspiradas no caso das mães de Bragança, nas vivências pessoais e no estereótipo que persegue brasileiras em Portugal até hoje, vai estrear em Lisboa o teatro documentário "Viemos roubar vossos maridos". A peça, criada por imigrantes brasileiras, estará em cartaz no final de abril e o início de maio.
Em entrevista ao DN Brasil, a dramaturga Maria Giulia Pinheiro explica que a produção não é apenas sobre a história em si. Para recordar, em maio de 2003, 150 mulheres assinam uma carta pedindo a expulsão das trabalhadoras do sexo brasileiras de Bragança, na região de Trás-dos-Montes. O caso teve repercussão internacional, com capa na revista TIME, por exemplo.
Por ser um teatro documentário, o roteiro é baseado também nas vivências pessoais das artistas: Tati Pasquali, que sofre, 20 anos mais tarde, as consequências na vida pessoal do que aconteceu; Camila Cerqueira, atriz migrada para Portugal no ano do acontecimento e que cresceu permeada com essas consequências e Eliene Lima, personagem real que protagonizou o fenômeno.
Maria Giu ouviu a história real de Tati no podcast brasileiro Rádio Novelo Apresenta e decidiu conversar com a entrevistada. "Eu já era obcecada por essa história, quando ouvi o episódio entrei em contato com a Tati e a partir daí criamos tudo", revela a dramaturga. O trabalho já tem mais de um ano e, agora, está na fase de ensaios e divulgação.
De acordo com Tati, a peça "trabalha em jogar luz para a rivalidade feminina como algo que constrói o sistema de dominação", ressalta a profissional. Um dos objetivos é provocar reflexões em todas as pessoas. "Essas mulheres [brasileiras e portuguesas do caso] têm muito a ver, mas não percebem. Bragança é uma região muito pobre, muito machista e há muitas falas machistas dos dois lados, como a de que as portuguesas 'não sabem segurar homem'", argumenta a atriz.
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A atriz já fez papéis em Portugal representando prostitutas. "É um grande elemento da minha história pessoal e profissional aqui em Portugal", destaca Tati. Ela conheceu Camila, colega de peça, em uma produção em que na compatriota também fazia um papel de prostituta.
A peça vai ser apresentada no espaço cultural Rua das Gaivotas 8, em Lisboa. De acordo com Maria Giulia, a realização só foi possível porque tiveram apoio da entidade desde o início. "A ideia sempre foi a criação ali, porque as gaivotas foram muito abertas para a gente fazer o espetáculo, sabíamos que o tema é polêmico", contextualiza a imigrante. Já os ensaios ocorrem na Biblioteca de Alcântara.
Se o palco foi fácil, os patrocínios não. "Praticamente todos os financiamentos foram recusados", contam. A produção é em grande parte independente, com cachê apenas para as atrizes. Elas afirmam ao DN Brasil não terem dúvidas de que se o tema fosse outro, seria diferente.
A dupla destaca que não sabe como será a repercussão, mas estão otimistas, especialmente pela possibilidade de falar a respeito do tema. "A gente está trabalhando com um estereótipo da mulher brasileira em Portugal e também um estereótipo das mulheres brasileiras sobre as mulheres portuguesas, tem esse lado importante também. Vamos olhar para essas contradições e entender como essas contradições movimentam", ressalta Tati.
Elas ainda afirmam que, talvez, não se chegue a nenhuma solução, mas "vamos olhar para o problema, para esse elefante na sala e temos que olhar para isso, estamos botando o dedo na ferida de todas".
Serviço
29 abril - 2 maio
terça - sexta às 20h00
3 maio
sábado às 18h00
Duração: 75min
Classificação etária: +18
Ingressos: 7€ / 10€ / 12€ - (os diferentes valores não correspondem a uma diferença de lugares, apenas permitem que se pague o mínimo ou, sendo possível, que se contribua com mais para apoiar as artistas). Estão à venda aqui.
Local: Espaço cultural Rua das Gaivotas 6 - endereço de mesmo nome.
Ficha técnica
Criação, encenação, dramaturgia e textos: Maria Giulia Pinheiro
Textos e Interpretação: Tati Pasquali, Camila Cerqueira e Eliene Lima
Realização em vídeo e Direção de Projeção: Anna Zêpa
Direção de cena e Design de iluminação: Lucas França
Direção de movimento: Deborah Kramer
Trilha Sonora: Ágatha Cigarra
Olhar Exterior: Patrícia Portela e Jorge Louraço
Artes Gráficas: Pat Cividanes
Apoio técnico: Hugo Vasconcelos
Produção: Tati Pasqualli e Maria Giulia Pinheiro
Gestão Financeira: associação FALA
Apoio: Bibliotecas de Lisboa, Câmara Municipal de Lisboa, Rua das Gaivotas 6, Fundação GDA
Residências: Biblioteca de Alcântara – José Dias Coelho, Rua das Gaivotas 6
amanda.lima@dn.pt