Dúvida desta semana é sobre o IRS.
Dúvida desta semana é sobre o IRS.Foto: Unsplash

Pergunte ao Advogado: recebi uma cobrança de 25% no IRS: o que fazer?

Tem uma pergunta? Basta enviar para o e-mail dnbrasil@dn.pt que a resposta será publicada às quintas-feiras no DN Brasil.
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O advogado brasileiro André Lima responde, todas as semanas, a uma dúvida dos leitores e leitoras do DN Brasil sobre imigração.

A pergunta desta semana vem uma leitora e está relacionada com o IRS.
“Cheguei a Portugal em julho de 2024, comecei a trabalhar com contrato e só fiz a alteração da minha morada fiscal nas Finanças em abril de 2025, quando recebi o email da biometria da AIMA. Entreguei minha declaração de IRS e recebi uma cobrança de 1.188€. O contabilista diz que está tudo certo. Mas e agora? Como posso pagar isso? O que devo fazer?”

O advogado André Lima responde:

"O caso é mais comum do que parece e a resposta passa por um ponto crítico e muitas vezes negligenciado pelos imigrantes: a atualização da morada fiscal junto à Autoridade Tributária.

Muitos estrangeiros acreditam, ou são orientados, que só podem fazer a alteração da morada fiscal após a obtenção da autorização de residência. No entanto, essa prática, embora tolerada na rotina administrativa, é contrária à legislação fiscal portuguesa e pode custar caro. Importa sublinhar que, mesmo após a emissão do título de residência, a alteração da morada fiscal nas Finanças não ocorre de forma automática. É necessário que o próprio contribuinte efetue essa comunicação junto da Autoridade Tributária, apresentando comprovativos da sua residência em Portugal.

O que diz a lei em Portugal?

De acordo com o n.o 1 do artigo 16.o do Código do IRS, considera-se residente em território português quem:

  • Permaneça em Portugal por mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, durante o ano fiscal;

  • Ou, tendo permanecido por menos tempo, possua habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual.

Para efeitos fiscais, a residência deve ser comunicada e comprovada à Autoridade Tributária. Ou seja: a obrigação de alterar a morada fiscal existe assim que o contribuinte reúne os elementos que caracterizam a residência fiscal e não apenas quando obtém um título de residência pela AIMA.

E a OCDE confirma essa interpretação:

Portugal é signatário da Convenção Modelo da OCDE para prevenir a dupla tributação, e adota a definição de residência fiscal do modelo internacional: considera-se residente aquele que:

  • Tem habitação permanente em determinado país;

  • Tem os seus “laços vitais” (família, trabalho, bens, etc.) nesse território;

  • Ou, na dúvida, permanece mais de 183 dias por ano.

Portanto, se um imigrante vive, trabalha e tem domicílio em Portugal, é residente fiscal desde o momento em que essas condições se verificam. Não há na legislação portuguesa qualquer regra que condicione essa condição ao título de residência emitido pela AIMA.

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Qual o problema de não alterar a morada fiscal a tempo?

Quando a morada fiscal do contribuinte não está atualizada, o sistema da Autoridade Tributária considera-o não residente, e aplica uma taxa fixa de 25% sobre os rendimentos obtidos em Portugal, sem direito a deduções, isenções ou escalões progressivos.

Foi exatamente isso que aconteceu com o leitor: a cobrança de 1.188€ não é uma multa, mas sim a consequência direta de ter sido tributado como não residente, por ausência de alteração de morada no momento certo.

Qual é a solução possível?

Para quem se encontra nessa situação, a melhor alternativa pode ser requerer a alteração retroativa da morada fiscal — com base em elementos objetivos e documentados, como:

  • Data de início do contrato de trabalho;

  • Data de celebração do contrato de arrendamento;

  • Data de entrada em território nacional;

  • Ou ainda, se for mais favorável, a data da emissão da autorização de residência.

Com esses elementos, é possível instruir um pedido fundamentado às Finanças, solicitando a retificação da situação cadastral e, se for o caso, a substituição da declaração de IRS com base no novo enquadramento.

Caso o pedido seja indeferido ou ignorado, há meios legais para reagir, incluindo reclamações graciosas, recursos hierárquicos e até impugnação judicial, especialmente quando o contribuinte é prejudicado por orientações contraditórias do próprio sistema.

Mais do que nunca, o imigrante precisa cercar-se de profissionais que compreendam as especificidades do enquadramento fiscal de estrangeiros, que saibam aplicar corretamente os tratados de dupla tributação e que não se limitem à mera entrega de declarações. Um contabilista atualizado ou um advogado fiscalista especializado são indispensáveis em casos como esse.

Atualizar a morada fiscal não é um simples detalhe administrativo. É um ato jurídico essencial para o correto enquadramento do contribuinte, que pode fazer a diferença entre pagar o justo e sofrer uma tributação indevida. Se você já trabalha e reside legalmente em Portugal, não espere pela autorização de residência para atualizar os seus dados nas Finanças.

Tem uma pergunta?
Basta enviar para o e-mail dnbrasil@dn.pt que a resposta será publicada às quintas-feiras no DN Brasil.
Quem é o advogado que responde?
André Lima, Advogado, inscrito nas Ordens dos Advogados de Portugal e do Brasil, pósgraduado em Finanças, Reestruturação e Contencioso Corporativo pela Universidade Católica Portuguesa, e pós-graduando em Direito Internacional, Imigração & Migração pela EBPÓS. É mentor dedicado de advogados em ascensão e membro ativo de diversas associações jurídicas, incluindo o IBDESC, ABRINTER e ABA, que destacam o seu compromisso com a internacionalização do direito e a sua contribuição para a comunidade jurídica internacional.
O DN Brasil é uma seção do Diário de Notícias dedicada à comunidade brasileira que vive ou pretende viver em Portugal. Os textos são escritos em português do Brasil.
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