Medo, impotência e impunidade são apontados como motivo para não denúncia de xenofobia por brasileiros
“Fiquei com medo de ser deportada, como os policiais disseram que seríamos. Fiquei muito machucada fisicamente, mas também não tive coragem de ir ao hospital, porque por se tratar de agressão física, teriam que chamar a PSP para investigar". Este é o depoimento de uma brasileira, residente em Setúbal, que foi agredida em um caso de xenofobia, mas não denunciou o caso às autoridades.
O relato está no relatório “Discurso de ódio e imigração em Portugal”, divulgado nesta semana pela Casa do Brasil. O documento aponta que 76% das pessoas que relataram ter sofrido discriminação não efetuaram denúncias.
"Os principais motivos destacados pelas pessoas migrantes inquiridas para não denunciar foram o medo, sensação de impotência, sentimento de impunidade, custo financeiro e falta de acolhimento", destaca o documento. “Havia pessoas próximas, autoridades, que viram e tentaram justificar o comportamento. Como denunciar se os próprios órgãos responsáveis não enxergam como agressão?”, pontua outra brasileira que mora no Porto.
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Os relatos ilustram diversas situações diferentes, envolvendo serviços públicos, autoridades policiais, serviços privados, entre outros. "É evidente a existência de desconfiança nas instituições por parte das pessoas migrantes", conclui o estudo.
Para Ana Paula Costa, coordenadora científica do relatório, o baixo número de denúncias preocupa. "É preocupante o número de denúncias, que é muito baixo. A maioria das pessoas que respondeu ter sofrido discurso de ódio não denunciou por desconfiança nas instituições e dificuldade de saber em qual meio denunciar, o que demonstra que há um mau funcionamento nesses canais de denúncia", explica ao DN Brasil.
De acordo com a acadêmica, uma forma de mudar este panorama seria dar formação aos profissionais que recebem as denúncias. "É preciso preparar melhor os profissionais que recebem as denúncias, porque muitas vezes o funcionário não está preparado para poder receber uma pessoa imigrante vítima de um crime ou de um discurso de ódio, no nosso caso específico do relatório", destaca a brasileira.
Falta de dados
Ana Paula Costa, que também preside a Casa do Brasil, analisa como importante que as denúncias sejam feitas, para que se tenha conhecimento dos casos. "Ter conhecimento desses dados é fundamental para poder combater e também criar medidas que fortaleçam a sociedade civil e combatam esse tipo de fenômeno", ressalta Ana Paula.
As poucas estatísticas em Portugal sobre os crimes de ódio, como xenofobia e racismo, são vistos pela diplomacia brasileira como um entrave para o diálogo com o Governo, sabe o DN Brasil. O tema já esteve em discussão nas reuniões preparatórias para a cúpula Brasil-Portugal, marcada para o dia 19 deste mês em Brasília.
Fontes consultadas pelo DN Brasil consideram importante tratar do tema, mas alegam que possuem poucas estatísticas para apresentar. "São poucos os casos que chegam até nós por e-mail e também sabemos que são poucos os registros policiais", disse um diplomata ao jornal.
O DN Brasil tem um guia sobre como denunciar casos de crimes de ódio contra imigrantes. O documento pode ser consultado aqui.
amanda.lima@dn.pt