Guto é narrador e mora em Braga.
Guto é narrador e mora em Braga.DR

Guto Nejaim, o narrador brasileiro que se tornou uma das vozes do esporte no Brasil e em Portugal

Há cerca de cinco anos, Guto trocou o Rio de Janeiro e a TV Globo, sua casa por quase duas décadas, pelo sonho de morar em Portugal. Por aqui, deu seguimento a carreira como narrador.
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O ano era 2018 e o jornalista esportivo Guto Nejaim narrava uma corrida da Moto GP no Sportv, emissora da Rede Globo, sua casa por quase duas décadas. Quando o português Miguel Oliveira foi o primeiro a cruzar a linha de chegada no circuito de Mugello naquela prova, o narrador carioca decidiu homenagear o lusitano. “Tinha decidido que, se ele ganhasse, eu ia recitar o hino português. Não deu outra. Na semana seguinte, o primo da minha mulher, que vivia em Portugal, mandou uma mensagem falando: prima, seu marido está em todas as televisões. O vídeo tinha viralizado, mais de 5 milhões visualizações, ou seja, metade de Portugal”, relembra Guto, em entrevista ao DN Brasil.

Depois do episódio, que levou o narrador a fazer participações em programas televisivos portugueses, dar entrevistas para jornais desportivos de Portugal, a sementinha de morar fora que já estava na cabeça dele e de sua família ganhou um ingrediente extra com o carinho recebido. Em 2020, após quase 20 anos narrando a maior quantidade de modalidades esportivas que o leitor pode imaginar, Guto decidiu finalmente trocar o Rio de Janeiro por Braga. Desde então, conseguiu feito raro para carreira de qualquer jornalista esportivo: narrar em emissoras de dois diferentes países.

“No dia que eu decidi sair da Globo, eu cheguei no carro e comecei a chorar. Pensei: caraca, o que eu estou fazendo. Apesar de querer sair, não foi uma sensação de alívio e sim, agora é sério. Minha mulher, que é médica, já tinha conseguido um trabalho em Portugal, esse era um dos principais motivos da mudança. Mas eu estava saindo de algo que tinha construído durante boa parte da vida para um desconhecido”, relembra Guto.

Foi a partir daí que Guto, que se diz um “homem de muita fé, mas não carola”, viu que Portugal era uma escolha que fazia parte do seu destino. Antes da saída da Globo, o combinado era de que sua família viesse antes, se estabelecesse, e ele depois de alguns meses, quando resolvido com a antiga empregadora, faria a mudança. 

Como a saída foi antecipada devido à mudança de planos na emissora com a Moto GP, principal modalidade narrada por Guto, que tem no currículo narrações com futebol, basquete, vôlei e mais uma dezena de modalidade de Olimpíadas e Olimpíadas de Inverno, o carioca resolveu vir mais cedo para Portugal.

Na mesma época, Fábio Seixas, antigo colega de Globo, também havia saído do canal e chamou Guto para ser narrador do automobilismo de forma remota pela Dazn. Chegou aqui já empregado.  “Tudo conspirou para vir para Portugal. Se não tivesse vindo quando vim, em fevereiro de 2020, ía ficar sabe-se lá quanto tempo sem ver minha família, foi poucas semanas antes da pandemia. Para mim foi a maior prova de que o destino está escrito”, conta Guto, que na época já estava apaixonado pelo país.

“Quando tinha vindo no ano anterior, antes de morar, eu era abordado na rua pela narração do Miguel Oliveira. Fui comer um leitão na Mealhada e o cara me ofereceu um vinho do Porto que o Roberto Carlos, Maria Bethânia, Caetano Veloso tinham tomado. De repente eu me apaixonei tanto por Portugal que era o que fazia sentido para minha vida [mudar para cá]”, recorda.

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Da Sportv do Brasil para Sport TV de Portugal

Antes de se estabelecer em Braga, onde manteve as narrações para a DAZN e seu trabalho como dublador na pandemia, Guto Nejaim havia sido convidado antes da pandemia pelo também jornalista brasileiro Mamede Filho, à época editor-chefe do canal de televisão português Sport TV, a conhecer a emissora. Com tudo parado durante os primeiros meses daquele ano, no entanto, a ideia não prosseguiu. Foi quando Guto, vendo que o canal transmitia jogos das principais competições da América do Sul, como Libertadores, Copa Sul-Americana e alguns estaduais, decidiu ir atrás do canal.

“Cheguei na Sport TV e falei: porque vocês não fazem esses campeonatos com um narrador brasileiro? Quem vê esses torneios são os brasileiros que moram em Portugal, não os portugueses. Convenci os caras, me chamaram para ir lá fazer um teste. Na semana seguinte, já estava escalado para final da Copa Sul-Americana. Duas semanas depois, estava na final da Libertadores”, conta. 

Quis o destino que numa de suas primeiras transmissões em rede portuguesa, um dos protagonistas fosse justamente o seu clube do coração, o Flamengo. Era a final de 2021, quando o clube carioca foi derrotado pelo Palmeiras por 2 x 1. O revés de seu time, no entanto, nem entra na conta ao lembrar desse momento. “Por mais que tenha perdido, narrar um jogo do seu time é uma emoção ímpar para o narrador. Eu fiquei anos na Globo chorando para narrar estaduais, cheguei aqui e já fui narrar uma final continental do meu time. Foi inacreditável”, relembra.

A partir daí, Guto foi ganhando espaço na Sport TV. Começou a narrar mais jogos, e voltou a participar das transmissões do esporte que se tornou um dos principais da sua carreira, o motociclismo. A princípio chamado para participar de um podcast sobre sobre a modalidade, Guto acabou virando uma das vozes da Moto GP ao narrar alguns dos circuitos da categoria nos últimos anos no principal canal esportivo português. No meio do caminho, voltou a narrar uma final de Libertadores do seu time do coração no mesmo canal, desta vez com um final feliz dentro e fora do âmbito profissional, com a vitória rubro-negra sobre o Athletico Paranaenese em 2022. 

Além da narração, Guto foi mantendo outros projetos, como um podcast com brasileiros e portugueses que acabou não dando continuidade a sua própria carreira enquanto dublador. No último ano, teve sua carga de narrações reduzida na Sport TV, embora ainda seja um dos narradores atribuídos no canal. 

Questionado se essa diminuição em suas aparições no canal tem a ver com alguma xenofobia, Guto diz não acreditar que seja algo do canal, mas admite que ser um narrador brasileiro em Portugal incomoda muita gente. “No futebol não tive quase nada de rejeição, mas na moto já foi mais complicado. Diria que no Twitter, no X, que é a latrina da internet e hoje ainda mais, cerca de 25% dos comentários que recebia eram mesmo de ódio. E daqueles que pega na pele, em 100 respostas, 25 eram duras de ouvir. Não é que não gostavam da minha narração, era mesmo por “ser zuca”, que “não tinha que fazer caridade comigo”. Doía bastante”, revela.

Agora já sem participar das narrações de motociclismo, Guto segue atrás de outros projetos no âmbito do jornalismo em Portugal. Sem se arrepender de ter deixado a Globo e a carreira para trás no Brasil, o narrador, sempre bem-humorado, olha pelo outro lado da história. “Vim para cá, com minha família, comprei minha casa, estou bem e voltar ao Brasil só se for para trabalhos pontuais, de vez nem pensar. Como diz a minha mulher, eu já vivi metade da minha vida. Agora que olhar para o que eu vou fazer com a outra metade”, finaliza o braisleiro.

nuno.tibirica@dn.pt

O DN Brasil é uma seção do Diário de Notícias dedicada à comunidade brasileira que vive ou pretende viver em Portugal. Os textos são escritos em português do Brasil.

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