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Aeroporto de Lisboa.Leonardo Negrão

Fim da gratuidade na bagagem de mão? Mudanças nos direitos dos passageiros causam polêmica na Europa

Brasileiros que vivem em Portugal e aproveitam voos low-cost entre países da UE podem ser impactados por reforma que ameaça gratuidade da bagagem de mão e indenizações por atrasos e cancelamentos.
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Uma das principais vantagens de viver na Europa é poder, com frequência, viajar entre países diferentes pagando pouco e enfrentando menos burocracia que em outras partes do mundo. Algumas das comodidades desse cenário, no entanto, podem estar com os dias contados.

Além do risco de perder o direito à bagagem de mão gratuita, passageiros podem também ver diminuídas as indenizações por atrasos e cancelamentos, que hoje garantem compensações financeiras a milhões de viajantes todos os anos.

A proposta de reforma do Regulamento (UE) 261/2004, que define os direitos dos passageiros aéreos no continente, foi aprovada na semana passada pelo Parlamento Europeu após ter passado pelo Conselho de Ministros da União Europeia. A medida tem gerado forte reação de especialistas e associações de defesa do consumidor.

Entre os pontos mais polêmicos estão o fim da gratuidade para malas de mão de tamanho tradicional e a elevação do tempo mínimo de atraso necessário para solicitar compensações financeiras.

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Se entrar em vigor, a nova regra limitará a bagagem de mão gratuita a um item pessoal com até 40x30x15 cm, que caiba debaixo do assento à frente. “Isso é significativamente menor do que as malas tradicionalmente aceitas. O que antes era um direito básico poderá se tornar um privilégio pago”, afirma Anton Radchenko, especialista em direitos dos passageiros e CEO da plataforma AirAdvisor.

Radchenko alerta que a mudança legaliza cobranças que antes já eram consideradas abusivas. Ele lembra que o Ministério do Consumo da Espanha multou companhias aéreas low-cost em 179 milhões de euros por cobrar ilegalmente pela bagagem de mão e pela marcação de assentos - práticas que passarão a ser permitidas, caso o novo texto seja implementado. “Até esse trabalho de proteção ao consumidor está agora em risco”, diz.

Além da bagagem, a proposta também altera regras sobre atrasos e cancelamentos de voos. Hoje, passageiros podem pedir indenizações a partir de três horas de atraso. Com a reforma, esse direito só poderá ser exigido após quatro horas em voos de até 3.500 km ou seis horas em voos longos.

“Isso cria um precedente perigoso, onde atrasos poderão se tornar regra e as companhias deixarão de ser penalizadas”, afirma o CEO da AirAdvisor. Os valores das compensações também caem pela metade: de 600 para 300 euros em voos médios e de 600 para 500 euros em voos longos.

Outra medida criticada é o retorno da chamada “regra de comparência”. Pela proposta, se o passageiro perder o voo de ida, a companhia aérea poderá cancelar automaticamente o bilhete de volta - sem reembolso completo. “Imagine chegar ao aeroporto e descobrir que seu voo foi cancelado no dia anterior. Isso é um retrocesso sem precedentes”, avalia Radchenko.

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Do lado positivo, a reforma impõe prazos mais curtos para que companhias respondam às queixas dos passageiros (14 dias) e obriga o reembolso em até 400% do valor da passagem, caso o passageiro precise buscar outro transporte e não tenha assistência da companhia. No entanto, especialistas consideram esses avanços insuficientes frente às perdas previstas.

Pesquisas mostram que a opinião pública europeia é contrária às mudanças. Segundo a AirAdvisor, 92% dos cidadãos da UE são contra o enfraquecimento do regulamento atual, e 76% apoiam o aumento das indenizações para refletir a inflação. “O público não está confuso, está unido e esclarecido. Os europeus querem proteções mais fortes, não mais brechas e taxas ocultas”, diz Radchenko.

Na semana passada, a AirHelp, empresa especializada em compensações aéreas, lançou uma petição liderada pela Association of Passenger Rights Advocates (APRA) pedindo a revisão da proposta - mais de 35 mil pessoas já assinaram. Tomasz Pawliszyn, diretor executivo da empresa, classificou as mudanças como “a regressão mais significativa na história da proteção dos consumidores da UE”.

Para os brasileiros que moram em Portugal e costumam dar uma escapadela de fim de semana - seja para outro país europeu ou para as ilhas portuguesas, como Açores e Madeira -, vale acompanhar de perto o desenrolar dessa reforma.

O que hoje é simples, barato e prático pode, em breve, virar dor de cabeça no check-in.

nuno.tibirica@dn.pt

O DN Brasil é uma seção do Diário de Notícias dedicada à comunidade brasileira que vive ou pretende viver em Portugal. Os textos são escritos em português do Brasil.
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