Texto: Cristina Fontenele *Em breve, terei que mudar de casa e a ansiedade já se instalou nos meus pensamentos. Deixar um espaço tão acolhedor que me abrigou por cinco anos para desbravar um território nem sempre amistoso para o imigrante. Os desafios já se apresentam enquanto lanço ao universo minhas intenções de encontrar um novo lar viável financeiramente, tranquilo e de fácil acesso a transportes públicos.Comecei a analisar anúncios nos sites especializados, nos grupos em redes sociais e me deparei com a realidade de preços e condições insanas. Além de alertas sobre golpes, comentários acerca de burlas e uma série de desabafos e pedidos urgentes de morada. “Preciso de um quarto até a próxima semana para mim e meu filho.”, apela um homem. Procurar casa é um mergulho em um microcosmo caótico que pode ser desanimador. Não está fácil para portugueses, tampouco para imigrantes sem dinheiro sobrando.Eu não estava alheia ao mercado, mas quando chega a nossa vez de buscar um teto, o aperto no bolso e no peito ganham forma e proximidade. A casa é a unidade de equilíbrio de uma pessoa. O eixo para a vida funcionar com um mínimo de estabilidade. O refúgio quando todo o resto ameaça desmoronar.A casa está ali para confirmar que você ainda tem para onde voltar e se restabelecer após aquele dia que não correu como o esperado. São os poucos metros onde o retrato da família ganha altar e pequenos objetos trazem a força do “continue”, “siga em frente”, “você vai conseguir”.Para o imigrante, a casa é bem mais do que uma simples habitação.Tenho lembrado de alguns relatos que já ouvi nessa árdua missão. Anúncios de imóveis que, na realidade, são Airbnb. O suposto proprietário faz a visita com o futuro inquilino, simula um contrato, recebe o dinheiro e depois some. Ou então, a pessoa que se apresenta como senhorio, aluga os quartos de um apartamento, recebe as rendas e não repassa ao senhorio real. Um dia, após meses de atraso no pagamento, aparece a polícia no imóvel a cobrar os inquilinos pela dívida. Os moradores ficam assustados, mostram recibos e se constata que todos foram enganados.Há umas semanas venho recebendo e-mails diários com ofertas a partir de um filtro que criei com o perfil do imóvel que busco. Outro dia, fui visitar um apartamento próximo de onde moro (continuar na mesma freguesia seria maravilhoso). A cozinha do local não tinha mesa para refeições e o quarto anunciado correspondia à metade do tamanho do meu atual, com uma pequena mesinha que só caberia o computador.E qual não foi a minha surpresa quando ouvi o senhorio comentar que a minúscula sala do T2 viraria mais um quarto. “Temos que rentabilizar ao máximo e quanto menor a convivência, menos problemas.” Percebo o receio de quem aluga um imóvel – querem certezas, pontualidade e paz, a qualquer custo.Clique aqui e siga o canal do DN Brasil no WhatsApp!Apesar de os proprietários terem sido educados, declinei da possibilidade de ficar confinada, sem espaço para respiro, interação e onde o único lugar de escape mental seria olhar para uma árvore através da janela.Ainda tenho uns meses de prazo para a saída definitiva da morada atual. Até lá, continuarei a busca, mentalizando que um novo lar é possível e que milagres acontecem antes do Natal. *Cristina Fontenele é escritora brasileira, com especialização em Escrita e Criação. Autora de "Um Lugar para Si - reflexões sobre lugar, memória e pertencimento”, além de jornalista e publicitária. Escreve crônicas há quinze anos e, como típica cearense, ama uma rede e cuscuz com café bem quentinho..O DN Brasil é uma seção do Diário de Notícias dedicada à comunidade brasileira que vive ou pretende viver em Portugal. Os textos são escritos em português do Brasil..Portugal registou 3.ª maior subida nos preços das casas na UE no final de 2024 .Flávia Motta: a carioca que virou referência para brasileiros no mercado imobiliário português