Sult: o restaurante carioca que atravessou o Atlântico para conquistar Portugal
Recém-inaugurada em Portugal, a casa liderada pelo chef brasileiro Nelson Soares já se destaca como uma das principais referências em culinária italiana no país.
Texto: Nuno Tibiriçá
Há quem diga que a região de Lisboa e Portugal como um todo não tenha muita tradição de comida italiana, pelo menos em comparação ao Brasil. Escolhido por centenas milhares de italianos no século XX, o Brasil tem uma cultura muito presente do país da bota, sendo São Paulo, por exemplo, a cidade com segunda maior imigração de italianos no mundo - atrás apenas de Nova Iorque.
Em Portugal, alguns chefs e empreendedores brasileiros têm trazido um pouco dessa tradição para cá. Após os sucessos de pizzarias como a Lupita e a Sofi, histórias que já contamos aqui no DN Brasil, outro restaurante comandado por um brasileiro tem mostrado que chegou para ficar na Terrinha. Inaugurado em maio deste ano, o Sult, em Cascais, que conta com a cozinha de autoria do chef Nelson Soares, é ainda novato, mas já tem a pompa de ser um dos especialistas em culinária italiana na região.
"O meu sócio se mudou para Cascais uns anos atrás e disse temos que abrir um Sult aqui. Eu nunca tinha vindo para Portugal, conhecia bem outros países da Europa, mas não aqui. E quando vim pela primeira vez, em 2021, me encantei. Aí começamos a colocar o plano em prática", conta Nelson.
A chegada do chef à cozinha profissional havia sido tardia. Até seus quase 50 anos, Nelson, hoje aos 53, trabalhava em laboratório e mantinha uma produção de carneiros - borregos em português de Portugal. Aficionado por gastronomia, o cozinheiro levava algumas das suas produções para a cozinha e começou a ser chamado para amigos para trabalhar em eventos. Nessas confraternizações, passou a ter mais contato com a alta gastronomia de diferentes países e foi se especializando em vinho: "É uma das coisas que sei bem", afirma.
Em 2019, Nelson Soares, junto a outros sócios, inaugurou o restaurante de comida italiana Sult em Botafogo, no Rio de Janeiro. Sucesso repentino na capital carioca, o restaurante teve, assim como muitos outros, um momento de instabilidade na pandemia que resultou na saída da parceria Foi aí que o antigo técnico de laboratório assumiu a cozinha da casa.
Em pouco tempo, o Sult bombou. Misturando ingredientes brasileiros e italianos, Nelson, de pai paraense e mãe cearense, buscou matéria prima ao redor do país para levar à sua cozinha. "Acabei fazendo um menu muito nessa linha de misturar Brasil e Itália: trouxe pirarucu fresco, um risotto de tucupi e jambu, por exemplo, um arancini de abóbora com queijo da canastra... temos uma lambretta, de Recife, até hoje na carta também", lista o chef, que viu seu restaurante ser incluído no Guia Michelin, maior galardão gastronômico.
Além de Brasil e Itália, outro país tem preponderância no conceito do restaurante: a Dinamarca. Além do nome do estabelecimento - Sult, em dinamarquês, significa fome - é também do país nórdico que vem outra das maiores influências de Nelson, o restaurante Mangia, em Copenhague. Na casa cascalense, aliás, a mesa onde Nelson e sua equipe finalizam os pratos é inspirada em espaço similar no estabelecimento dinamarquês.
O menu do SULT Cascais
Alguns pratos que eram carro-chefes na casa carioca atravessaram o Atlântico junto de Nelson. Nas entradas, o cogumelo cacio e pepe e o grissini feito com polvilho que lembra o biscoito globo, um dos principais cartões postais da gastronomia carioca, são alguns deles. As Ostras do Sado e Lulas à Gremolata (molho de salsa, alho e limão) grelhadas com inspiração no churrasco uruguaio - um dos países favoritos de Nelson - são outros pratos que comprovam desde o início de que a experiência no Sult é especial.
Nos pratos principais, há aqueles que "fazem as pessoas quererem voltar ao restaurante", segundo Nelson. A Lasanha Sult (com fonduta de parmesão e jus da carne), inspirada em receita de Massimo Bottura, outra referência do chef e o Tortellini de Aspargos e Mascarpone (com molho de pecorino) são duas das especialidades. Frêgola com Polvo e Tutano, Risotto de Pato Confit e Arrosto Caprino (cabrito de leite assado com purê de batata doce e bimi grelhado), são outras opções.
Nelson também colocou na carta algumas criações mais inspiradas na gastronomia portuguesa: nas entradas, por exemplo, há o Arancini de Alheira com Queijo do Azeitão. Já nos principais, o Pappardelle ao Ragu de Porco Preto (feito com bochechas de porco preto alentejanas, tomate e vinho tinto), é outra sugestão.
Sempre acompanhado de um bom vinho da bem composta adega da casa, a refeição do Sult acaba da melhor maneira possível na sobremesa. O Tiramisù de Pistache e o Bolo de Chocolate com Pralinè de Avelã são alguns dos destaques.
Com o sucesso da ainda nova unidade do Sult Cascais, Nelson e sócios já começam a preparar os próximos passos do investimento: bar de vinhos no Porto e em Lisboa, um restaurante de churrasco com toque oriental em Cascais e outro em um hotel em Troia são alguns dos empreendimentos à vista.
Estabelecido em Cascais, Nelson continua indo ao Rio de Janeiro algumas vezes ao ano para gerir a casa que vai fazendo cada vez mais sucesso no Brasil. Além da presença no Guia Michelin, o Sult Rio foi incluído, em janeiro deste ano, no 50 Best Dicovery, relação de mais de 3.000 lugares no mundo que merecem ser visitados, em 640 cidades - na cidade fluminense, por exemplo, são 17 casas.
"Vir para cá foi uma decisão muito acertada. O restaurante só cresceu desde que abrimos, tanto lá no Brasil, quanto aqui, e agora é olhar para onde podemos estender mais o projeto ao redor de Portugal. Amo o Rio de Janeiro, volto para visitar, trabalhar. Mas agora, minha casa é aqui", finaliza Nelson.
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nuno.tibirica@dn.pt