Jornada 6x1: esquema em debate no Brasil é permitido em Portugal
O DN Brasil conversa com o advogado português Pedro da Quitéria Faria, especializado em questões trabalhistas, e explica o que pode - e o que não pode - em Portugal.
Texto: Caroline Ribeiro
Nos últimos dias, o Brasil tem acompanhado o acalorado debate sobre o possível fim da jornada 6 x 1. A deputada Erika Hilton (PSOL-SP) formalizou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê o fim da escala de seis dias de trabalho para um de descanso, sem redução de salário, e conseguiu o número de assinaturas necessário para que a PEC seja protocolada na Câmara dos Deputados.
Brasileiros em Portugal não passaram alheios às discussões no Brasil. Até porque a realidade de muitos neste lado de cá do Atlântico passa pelo cumprimento de uma jornada semelhante. De acordo com o advogado Pedro da Quitéria Faria, sócio no escritório Antas da Cunha Ecija e especializado em direito do trabalho, a escala 6 x 1 também é permitida em Portugal.
"O que é imperativo é que exista um dia de descanso semanal obrigatório, que normalmente, salvo em casos reacionais, é o domingo. E deve existir também, embora esse não seja imperativo, o chamado descanso suplementar. Que é, normalmente, ao sábado. Estes dias têm que estar balizados pelos períodos máximos do limite de tempo de trabalho. Ou seja, tirando também exceções e mecanismos de flexibilidade, são as oito horas do dia e quarenta por semana", explica ao DN Brasil.
O advogado alerta que se o trabalhador estiver ultrapassando este limite, como no caso de jornadas de nove horas diárias, estará realizando trabalho suplementar, ou seja, horas extras. O número de horas extras permitido por ano em Portugal, em geral, é de 150 horas, podendo ser ajustado com instrumentos de flexibilidade, como o banco de horas. Caso o trabalhador esteja em situação de trabalho suplementar "e não tem nenhum destes mecanismos, nem isenção, nem horário concentrado, nem banco de horas, o que seja", diz o advogado, deve requerer o pagamento das horas extras.
"Se isso não acontecer, terá sempre as duas vias clássicas. Uma é dar nota do que se está a passar junto à Autoridade para as Condições de Trabalho [ACT], para que haja uma inspeção. E duas, consultar um advogado para que analise todo o contexto e para que interpele a empresa no sentido de regularizarem o pagamento dos créditos, também dando nota das contraordenações graves que estarão a incorrer. E se isso não for o suficiente, a via normal é da propositura de uma ação em Tribunal do Trabalho", completa Faria.
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Em comparação com o Brasil, onde a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) rege as relações trabalhistas, em Portugal, a principal legislação do setor é o Código do Trabalho. Este documento estabelece os direitos e deveres de trabalhadores e empregadores. No entanto, existem também acordos coletivos de trabalho para certas categorias de profissionais que podem adicionar cláusulas específicas, dependendo do setor ou da empresa.
A ACT é o órgão responsável pela fiscalização e investigação de condições de trabalho no país e pode intervir em qualquer situação que envolva contraordenações laborais, aplicando multas aos empregadores que descumpram a legislação. "Se o trabalhador perceber que seus direitos estão sendo violados, pode formalizar uma denúncia junto à ACT, que irá realizar uma inspeção e, se necessário, impor penalidades à empresa", afirmou.
Semana de 4 dias
Se o fim da escala 6 x 1 é o grande debate atual do mundo trabalhista no Brasil, Portugal está mais próximo das discussões sobre a implantação da semana de 4 dias: quatro dias de trabalho e três de folga. O país tem um projeto piloto em execução, que tem mostrado resultados positivos tanto para os empregadores quanto para os trabalhadores.
No entanto, Pedro Faria ressalta que a implementação dessa medida será gradual e demandará uma adaptação significativa, especialmente nos setores que ainda não adotam essa abordagem. "Portugal está na vanguarda da discussão sobre a redução da jornada de trabalho, mas acredito que a adoção em larga escala ainda leva tempo", afirma o advogado.
caroline.ribeiro@dn.pt