Fim da Manifestação de Interesse. E agora?
Medida pegou de surpresa quem já está morando em Portugal e ainda não tinha dado entrada na famosa MI. Mas há opções.
Texto: Amanda Lima
"Estou em Portugal, já tenho NIF, NISS e estou trabalhando, mas não dei entrada na Manifestação de Interesse.” Esse é um dos vários relatos recebidos pelo DN Brasil nos últimos dias, após o fim da possibilidade de ingressar com novos pedidos de Manifestação de Interesse. A medida, que entrou em vigor poucas horas após o anúncio, pegou de surpresa muitos imigrantes, sobretudo brasileiros, que usariam o mecanismo para obter uma Autorização de Residência (AR) em Portugal. Nos últimos anos, a famosa “MI” se tornou o principal meio de regularização no país.
Segundo a advogada e professora Emelin de Oliveira, esse caminho se tornou tão popular que “dava quase a sensação de que era a única via que as pessoas tinham para regularizar a sua situação administrativa”. No entanto, existem outras opções, mesmo para quem já está em Portugal.
De acordo com Emilin, brasileira que é coordenadora da Pós-Graduação em Direito dos Estrangeiros e da Nacionalidade e com longa experiência na área de imigração e asilo, o artigo 122.º da Lei dos Estrangeiros pode ser uma saída legal. É a “Autorização de Residência em situações especiais”. Alguns dos exemplos concretos previstos em lei são os estrangeiros com filhos menores em Portugal, dos quais sejam responsáveis. Outro exemplo é para quem sofre de uma doença que necessite de tratamento médico e não possa retornar ao país de origem.
A pesquisadora cita também o artigo 123.º da mesma lei, intitulado “Regime excecional”. Emelin relembra que, antes de 2017, quando foi criada a Manifestação de Interesse, o artigo já era bastante utilizado. Conforme Emelin, o princípio do 123.º é amplo. “Devem ter por base razões de interesse nacional, razões humanitárias, ou razões de interesse público decorrentes do exercício de uma atividade relevante no domínio científico, cultural, esportivo, econômico ou social”, explica.
Um decreto regulamentar, isto é, uma publicação que detalha uma lei, prevê outra situação que pode beneficiar quem já está trabalhando em Portugal e ainda não deu entrada na Manifestação de Interesse. Podem ser “ponderadas as circunstâncias concretas do caso, como razões humanitárias a inserção no mercado laboral por um período superior a um ano”, destaca o documento número 84/2007 de 5 de novembro.
No entanto, estar trabalhando em Portugal há mais de um ano não é a única regra. A especialista alerta que, diferente das manifestações de interesse, “não há um direito à autorização de residência”. Na prática, significa que cada caso será analisado e decidido por um membro do Governo. Sobre o visto CPLP para quem já está no país, ainda não há previsão para que entre em vigor, nem quais serão os requisitos exigidos.
Conseguir um agendamento, o desafio
Como comprova Emelin de Oliveira, soluções dentro da legislação existem. O desafio pode ser conseguir um agendamento na Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) para realizar o pedido. As opções de marcações disponíveis são o telefone e e-mail. No entanto, a própria AIMA reconhece que não consegue dar conta de atender a todos os pedidos. Reclamações de imigrantes que não conseguem contato com a agência são comuns. Há quem tente ir presencialmente aos balcões da AIMA espalhados pelo país. No entanto, fora os agendamentos já marcados, são escassas as vagas para outros atendimentos.
No Porto, por exemplo, há quem chegue ainda na madrugada para tentar ser atendido. Há um papel na porta que destaca a “limitação” no número de senhas disponíveis por conta da “forte procura”. Está prevista a criação de um portal online para pedido dos vistos, mas sem previsão de estar em vigor. Segundo a jurista, outra possibilidade é recorrer aos Tribunais Administrativos - que já está com 4 mil processos para serem decididos.
Quem está no Brasil
“Vendi tudo, estou de malas prontas e passagem comprada para Portugal.” Este também é um dos muitos relatos recebidos pelo DN Brasil após o anúncio do fim da Manifestação de Interesse. Nestes casos, existem muitas opções disponíveis.
Apesar de a MI ter se tornado a regra da imigração, especialmente para brasileiros, os vistos no país de origem sempre existiram. O pacote apresentado na semana passada não possui nenhuma alteração nos tipos de vistos já existentes. Aliás, é esta a forma de imigração que o atual Governo quer promover: com visto, que é solicitado antes da viagem.
O pedido precisa ser feito nos consulados portugueses. No Brasil, são 11 postos, sendo o país com maior número de locais de atendimento. O Governo português atua em parceria com uma empresa privada, a VFS Global, que também recebe os pedidos.
Um dos vistos mais buscados por brasileiros é o de “procura de trabalho”. Criado em 2022, tem o objetivo de suprir a falta de mão-de-obra em setores chaves do país, especialmente na área do turismo. Com esse visto, o cidadão tem autorização para entrar em Portugal e procurar um trabalho com contrato (recibos verdes não são válidos neste caso).
O prazo para assinar o contrato é de 120 dias, sendo possível prorrogar por mais 60 dias. Se ao fim deste período o imigrante não conseguir um emprego com contrato, precisa obrigatoriamente deixar o território. Um dos requisitos é ter o valor de 2460 euros (cerca de 12,3 mil reais) para aprovação.
Há também o próprio visto de trabalho, um dos mais antigos da lei. É destinado aos que já possuem um contrato de trabalho em Portugal. Confira aqui quais os demais tipos de vistos existentes.
amanda.lima@globalmediagroup.pt