"Vá pentear macacos e macacas". "Os portugueses estão de saco cheio de vocês todos da vossa nacionalidade [brasileiros]". "Desapareçam do mapa de Portugal e sejam muito felizes longe de Portugal". Segundo o Ministério Público, estas e outras frases publicadas por uma portuguesa não são crime."Não pode confundir-se a injúria/difamação com a indelicadeza, com a falta de polidez, com a grosseria, comportamentos que relevam não mais do que falta de educação e de civismo", consta no arquivamento da denúncia, a qual o DN Brasil teve acesso.A denúncia foi feita por Anna Luiza Pereira e Ticiane dos Santos, ambas advogadas e apresentadoras de um podcast. Os comentários foram publicados contra as profissionais no Instagram.Anna diz ao jornal que a decisão é frustrante. "Ver um caso de discriminação ser arquivado com base em argumentos que minimizam o impacto real da violência simbólica e psicológica sofrida é frustrante — não só para quem denuncia, mas para toda a sociedade", desabafa a advogada.Segundo o procurador Manuel Maria Otero dos Santos, não houve crime de injúria ou difamação, nem criminalmente punível "por não existir no Código Penal qualquer norma que pune diretamente condutas racistas". Na visão do promotor, o artigo 240º do Código Penal, sobre discriminação e incitamento ao ódio e à violência, "não é manifestamente aplicável neste caso".A brasileira relata que sabia que seria difícil que o caso tivesse avanço, mas não esperava as razões do arquivamento. "Ao denunciar, sabíamos que seria difícil o reconhecimento da gravidade dos insultos, mas jamais esperávamos que fosse tratado como um comportamento socialmente reprovável. Esperávamos que o sistema de justiça atuasse com a seriedade necessária", explica.Clique aqui e siga o canal do DN Brasil no WhatsApp!Na visão da imigrante, o arquivamento de denúncias como esta passa uma mensagem de permissividade. "Quando o sistema não responde de forma contundente, a mensagem que se passa é a da permissividade. A impunidade normaliza comportamentos discriminatórios e reforça a ideia de que ofender, excluir ou humilhar com base na origem ou na cor da pele não tem consequências. Isso é extremamente perigoso", avalia. A usuária do Instagram que escreveu as frases possui outros diversos comentários semelhantes..Para a advogada, Portugal precisa de leis que possam ser aplicáveis nestes casos. "Portugal tem compromissos internacionais claros de combate ao racismo e à xenofobia. Mas na prática, ainda faltam mecanismos legais mais eficazes para punir essas condutas. O enquadramento penal atual muitas vezes não acompanha a complexidade e sutileza dos atos discriminatórios. Precisamos, sim, de leis mais claras e aplicáveis — e sobretudo de uma cultura jurídica mais sensível às realidades das vítimas", argumenta..PSP e GNR receberam quase 1000 queixas por discriminação e racismo em quatro anos.Atualmente, existe uma iniciativa para que Portugal tenha um lei que efetivamente criminalize casos de racismo e xenofobia. Foi aberta uma consulta pública que precisa reunir 20.000 assinaturas para que seja discutida no Parlamento. Até agora, o pleito possui cerca de 8.600 assinaturas. "O racismo tem que ser crime", apelam os criadores da iniciativa. A proposta começou a ser discutida no ano passado por um grupo de ativistas. Para assinar, é preciso ter nacionalidade portuguesa.amanda.lima@dn.pt.O DN Brasil é uma seção do Diário de Notícias dedicada à comunidade brasileira que vive ou pretende viver em Portugal. Os textos são escritos em português do Brasil..Desinformação pela caixa do correio: o ódio, o engano e a xenofobia de grupos extremistas.Portugal reconhece na cimeira que há xenofobia contra brasileiros