Em Portugal, cultura da "marca branca" é aliada da economia
Hábito entre os portugueses, pé atrás para os brasileiros. Comprar os produtos fabricados pelas próprias marcas garante poupança no fim do mês. Números mostram que, em cinco anos, a venda de artigos das marcas brancas passou de 32% para mais de 45% no país.
Texto: Caroline Ribeiro
Quem mora em Portugal certamente já deixou de comprar algum queijo daquela famosa marca francesa que começa com P para levar para casa um outro, de embalagem muito semelhante, de uma marca própria de uma rede de supermercados. Também já deve ter trocado o famoso pote cor de rosa de um tira-manchas de roupas internacional por um quase igual fabricado por outra rede varejista. Os dois são exemplos simples de como as marcas brancas fazem parte do dia a dia do país.
A carioca Alessandra Virzi, que trocou o Rio de Janeiro por Cascais no final de 2017, não esconde o choque inicial. "Eu tinha um pouco de preconceito com as marcas brancas. Eu falava assim, 'será que é boa?'. Porque no Brasil a gente não tem esse hábito. Eventualmente, usa alguma coisa, mas não faz parte da nossa rotina de mercado. Aqui, não é que seja só parte da rotina de mercado, é efetivamente uma forma de consumo", diz ao DN Brasil. "Num primeiro momento, o brasileiro tem um pouco de vergonha. Quando percebe que não, que é um produto bom, que o português usa, aí entra na vida dele", completa.
Durante o auge da pandemia, com o severo lockdown implantado no país, ir ao supermercado era a única atividade que a brasileira tinha fora de casa. Foi assim que "se especializou", conta rindo, e virou "a tia dos mercados". O convite de uma amiga fez com que o público em seu perfil no Instagram, onde já compartilhava dicas de compras, crescesse. "Ela disse: 'vamos fazer uma live sobre marcas brancas?'. Eu separei produtos de um mercado, ela de outro, íamos mostrando. Esse é bom, esse eu gosto, e foi um sucesso".
Economia com qualidade
Números apurados pelo Diário de Notícias mostram que, em cinco anos, a venda de produtos das marcas próprias dos supermercado passou de 32% para mais de 45%. Antes, o valor arrecadado com estes artigos respondia por cerca de 5,6 bilhões de euros dos lucros das empresas, passando para 7,8 bilhões de euros atualmente. Redes como as portuguesas Continente e Pingo Doce, a espanhola Mercadona, e as alemãs Lidl e Aldi apostam forte nos artigos das marcas brancas em todos os segmentos.
"As marcas têm produtos de alimentação, de tecnologia, tem cosmética, tem roupa. Aí você consegue ter uma dignidade nos produtos. Se você pegar a linha gourmet de Natal do Lidl, é inacreditável a qualidade. Então uma pessoa que não quer gastar muito, consegue. Eu chamo de 'produtos honestos', porque é um custo-benefício incrível", diz Alessandra Virzi. Formada em administração, a brasileira ressalta que ser de marca branca não significa ser barato. "Fico incomodada com quem faz coisas no estilo 'tudo o que comprar com 10 euros em Portugal'. Tem que ter consciência, até porque está tudo mais caro atualmente", diz, destacando que se houver uma organização prévia em casa a popupança pode ser significativa no fim do mês. "Se puder esperar a semana do produto entrar no folheto, você economiza até metade do valor", afirma.
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A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), órgão fiscalizador que é uma espécie de ANVISA de Portugal, analisa que, de uma forma geral, comprar produtos da marca branca traz poupança de cerca de 30% aos consumidores no valor da cesta básica.
Mas com tanta popularidade dos artigos genéricos, vem também a alta procura. É comum ver a propaganda nos folhetos semanais e, logo em seguida, o produto estar esgotado. A própria Alessandra já passou por isso quando tentou comprar uma panela de fondue. "Vi a propaganda no folheto e logo fui ao mercado, cheguei 12h, não vi nenhuma. Perguntei e já estava esgotada. A senhora disse 'você tem que vir quando abrir'. Demorou alguns meses, quando apareceu de novo no folheto eu fui à logo às 10 pras 8 da manhã. Entramos eu e um monte de gente pra pegar a panela, que é sensacional", conta.
A brasileira sabe que as rotinas mais puxadas não dão trégua e que nem todo mundo vai conseguir estar tão cedo numa loja só para economizar. Por isso, dá uma dica. "Aquela coisa de compra do mês, hábito no Brasil, aqui não existe. As redes mudam os folhetos a cada semana. A dica é saber em que dia da semana começa o folheto daquela rede e tentar ter paciência. Com uma compra semanal de menos produtos a economia pode ser muito significativa".
caroline.ribeiro@dn.pt