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DJ Zé Pedro: “Hoje em dia não existe mais olho no olho, agora é só like no Instagram”

Além de animar festas como DJ, desde eventos ao lado de Gisele Bundchen a noites cariocas intermináveis, o brasileiro é uma espécie de enciclopédia de música.

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por DN Brasil
DJ Zé Pedro: “Hoje em dia não existe mais olho no olho, agora é só like no Instagram”
DJ brasileiro esteve em Lisboa recentemente. Foto: Paulo Alexandre / Global Imagens

Zé Pedro é conhecido, especialmente no Brasil, por muitas coisas. Além de animar festas como DJ, desde eventos ao lado de Gisele Bundchen a noites cariocas intermináveis, o brasileiro é uma espécie de enciclopédia de música. Um pouco deste conhecido está no livro “Mela Cueca: as canções de amor que o mundo esqueceu”, apresentado recentemente em Lisboa e conversou com o Diário de Notícias.

Por que decidiu escrever o livro?

A música que eu mais gosto desapareceu do mundo, que é essa música romântica da década de 70, que a gente chamava charmosamente de “Mela Cueca”. Era um apelido que o locutor de rádio Big Boy, o Felipe Zerão, deu para essas músicas.  Aí eu fiz esse inventário e contei a historinha de cada canção. Não é uma lista definitiva, é uma lista em cima da história da minha vida, porque toda vez que alguém pensa em roubar minhas playlists, se dá mal, porque só tem essas músicas românticas da década de 1970. Eu descobri uma editora chamada Garota FM, que só lança livros de música, é de uma menina jovem, muito interessante. Sonhei que eu mandava pra ela essa lista. Eu acordei, respeitei meu sonho, mandei mensagem e ela gostou da ideia.

O título do livro não é polêmico?

Eu sou louco por novelas da década de 70, né? E a Globoplay agora está reprisando muitas. Eles explicam, com uma tarja preta no início avisando que aquele comportamento é de uma época. Então eu acho que esse nome, o “Melca Cueca” hoje, é um pouco pejorativo, esquisito. Eu acho que ainda mais aqui, em Portugal, que a língua é mais literal, especialmente. Mas, ao mesmo tempo, tem essa chamada comercial. Mas ninguém, lá no Brasil, ninguém ficou assim, assustado. Não teve o cancelamento. Ninguém morre de rir, é tipo, mas o que é “Mela Cueca”, entendeu? E é isso, eu acho que o subtítulo explica. Então antes de me cancelar, é algo assim, “calma meu amor”.

Antigamente as músicas de sucesso eram as das novelas. Hoje em dia vejo que esse poder não existe mais. O que substitui a música da novela? 

Hoje tem glória pra todo mundo. O que acontecia naquela época, era que só quem entrava na novela, é que poderia chegar ao Globo de Ouro, que era um programa com as dez mais tocadas da semana. Hoje não existem mais as dez mais da semana. Todo mundo tem seu nicho, todo mundo tem seus seguidores. A música ficou mais democrática, porque antes ficava na mão de uma gravadora, na mão de um dirigente. Hoje em dia, se você quiser fazer a música no teu quarto, você pode estourar com essa música sem ter um padrinho. Era um tempo da música com padrinho, hoje a tua conversa é com os seguidores, Você tem que seduzir o público ali. 

Acha que existe  alguma música que possa ser classificada como mela cueca atual?

Eu acho que ela foi se transformando. O livro, por exemplo, vai até 1980, porque em 1980 começaram a entrar os teclados eletrônicos. Depois, nos anos 1990, que começam as divas, é Mariah Carey, Anita Baker, Janet Jackson, todas tinham uma canção romântica de sucesso. Eu acho que a música romântica é diluída mesmo a partir do ano 2000, quando acabou. Hoje, se a Beyoncé canta uma canção de ritmo mais lento, o povo já acha chato. Desde os anos 2000 parece que o mundo é tão feliz que só tem música animada. Acabou também o cantor romântico. É uma pena.  Acho que as pessoas hoje estão muito ligadas ao aplicativo e quando conseguem ficar com alguém e a pessoa diz, “olha, a gente não está namorando ainda. A gente está ficando, mas já faz seis meses. Sim, mas ainda estou muito traumatizado, porque eu tive um casamento muito longo”. O romantismo realmente evaporou.

Pensa que hoje as pessoas estão muito dependentes das  aplicações e não sabem mais flertar no mundo real?

Não sabem mais, porque agora é o seguinte, você não me quer, venha o próximo, por favor. Naquela época você ficava sonhando com aquela pessoa até ela te querer ou não. Eu, por exemplo, era o rei do platonismo e ficava meses, semanas, pensando, indo na boate para reencontrar aquela pessoa que estava sempre feliz com outra, né? Na hora da mela cueca, era no meio do baile. Baixava a luz e ficava 30 minutos uma música romântica e aí quem você estava de olho, você chamava para dançar. Eu acho que isso acabou. O maior retrato dessa virada, por exemplo, são as canções da Ana Carolina.  Quando surgiram veio com empoderamento. Esse empoderamento não tinha antes. Antes era tudo tão real, sabe? Era olho no olho,  hoje eu não encontro mais isso, não vejo nas festas. Hoje é tudo no Instagram, o like no story é o novo olho no olho, mas essa sedução no inbox não me convence, porque é artificial. 

Como define o amor? 

O amor é a única coisa que não tem negociação no mundo. Eu sou filho único e a minha mãe me ensinou que eu ia ter tudo o que eu quisesse. Quando eu fui para o colégio e me apaixonei pela primeira vez, eu vi que o amor precisava de uma negociação entre duas pessoas. Você tinha que entrar em um acordo comigo, me querer. Se consegue pagar um sexo, consegue pagar até mesmo um amor inventado. Mas você sabe quando o amor é inventado e quando é real. O amor é a única coisa inegociável. E é para mim eternamente uma dúvida, entendeu? Aonde que ele está? Porque como ele apareceu para mim duas vezes de forma inesperada, eu fico pensando, será que é você que vai me amar? E isso não acontece, mas eu fico sempre na espera, porque é realmente um assunto que mais me interessa, é o amor mesmo. Mesmo que eu só tenha tido dois amores na vida. O amor é a coisa mais incrível do mundo. E quando você é amado, é impressionante. Amar você ama o dia inteiro, né? Mas ser amado de verdade é um negócio que é para poucos.

Acha também que a internet, por outro lado, possibilita o retorno dos grandes sucessos? 

Antes você estava na mão das gravadoras, agora é do algoritmo. A Tetê Espíndola acabou de voltar de uma forma inacreditável com a música “Escrito nas estrelas”. As crianças nem sabem quem é Tetê Espíndola, mas como eu trabalho para todo tipo de geração na pista, quando  estou tocando com uma pessoa de no máximo 20, é muito desconcertante tocar esses artistas junto com a Ludmilla e ter a mesma força. É uma coisa muito doida para mim. Estou tocando a Ludmilla, Luiza Sonsa, Anitta, estou sintonizado com a geração de agora. No meio, toco “Escrito nas estrelas” e tem a mesma força no público, fazendo roda, todo mundo cantando. Talvez a única salvação para a canção do passado, para os artistas do passado, é eles caírem nas graças do TikTok. 

Você define a música romântica de antigamente como “erótica chique”, hoje muitas delas  são totalmente explícitas e ouvidas por crianças. O que pensa disso?

Sim, hoje é tudo eu vou sentar, vou enfiar, vou isso, vou aquilo, é o tempo todo essa loucura. Mas repito, é um empoderamento que não me convence. Em relação ao controle disso, com as crianças, por exemplo, não tem como controlar. Naquela época o chique para ser incluído na turma era fumar e beber. Hoje, uma criança que não tem celular está excluída do grupo, se pegar o celular, essa arma do diabo, acabou. Mas eu tenho pensado nesse assunto. A pessoa é para o que nasce. Eu não vejo essas crianças virando alguma coisa, pelo menos as que estão perto de mim, virando alguma coisa por causa da internet. Ninguém vira gay por causa da Pabllo Vittar e ninguém vira sertanejo por causa do Gustavo Lima. Mas assim, meu filho virou gay por causa da internet, isso não existe.

amanda.lima@globalmediagroup.pt

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