Comunidade brasileira com título de residência ultrapassa os 600 mil
São mais de 615 mil cidadãos a viver no país com tal documento, de acordo com dados exclusivos obtidos pelo DN Brasil junto à Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA).
Portugal ultrapassou, no final de 2023, a marca dos 600 mil brasileiros com título de residência. São mais de 615 mil cidadãos a viver no país com tal documento, de acordo com dados exclusivos obtidos pelo DN Brasil junto à Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). No ano passado foram emitidos 222.827 títulos, um aumento de 414% na comparação com 2022.
O aumento exponencial tem uma explicação: a criação, em março de 2023, do título de residência ao abrigo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Os documentos contemplam quem havia solicitado um visto de residência no país de origem a partir de 31 de outubro de 2022 e quem havia ingressado com Manifestação de Interesse (MI) já em Portugal até o ano de 2022. Ou seja, parte do número já vivia no país e passou a ter um título de residência.
O número coloca o Brasil ainda mais à frente no que diz respeito às demais nacionalidades com cidadãos vivendo em Portugal. Segundo o relatório de 2022, em segundo lugar vinha o Reino Unido, com pouco mais de 45 mil cidadãos, seguido de Cabo Verde, com mais de 36 mil imigrantes. Ainda não estão disponíveis dados totais de 2023, previstos para serem divulgados nas próximas semanas.
O total de brasileiros no país ultrapassa os 615 mil, já que não há dados disponíveis sobre quantos vivem em Portugal com cidadania luso-brasileira ou outra dupla cidadania, como a italiana. Também precisam entrar no cálculo a legião que ainda aguarda pelo documento.
O certo é que Portugal é o segundo país com maior número de brasileiros no mundo, perdendo apenas para os Estados Unidos, com 1.9 milhão, segundo dados do Governo brasileiro. Ao longo dos anos, os fluxos migratórios entre Brasil e Portugal foram influenciados por diferentes contextos históricos, econômicos e sociais.
A maioria dos portugueses acredita que os brasileiros se adaptam bem à condição de imigrante. Uma investigação, desenvolvida pela Lisbon Public Law (Centro de Investigação em Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) apresenta a comunidade do Brasil como os imigrantes mais bem adaptados. A maioria (72,2%) considera a comunidade brasileira como a mais bem integrada ao país, ficando até mesmo à frente dos imigrantes de países europeus (41,2%). Em terceiro lugar, aparece a comunidade africana dos Países de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) (32,4%).
Dados coletados pelo extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) indicam que 67,6% dos imigrantes brasileiros em Portugal têm entre 20 e 49 anos, 46,2% são homens e 53,8%, mulheres. A imigração contribui para rejuvenescer o território, pois enquanto os imigrantes estão em grande maioria na idade ativa, a população portuguesa concentra apenas 38,5% dos seus cidadãos nessa condição.
Portugal está em quinto lugar entre os países com a população mais envelhecida do mundo, conforme dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com 23,4% numa idade igual ou superior a 65 anos. De acordo com uma estimativa do Observatório da Emigração, 30% dos jovens, entre os 15 e os 39 anos, deixam Portugal para morar em outro país. Atualmente, há 604 mil portugueses como imigrantes só na França.
Os brasileiros contribuem ainda para melhorar a taxa de natalidade do país, pois 6,7% dos bebês nascidos em Portugal no ano de 2022 tinham mães brasileiras.
Contribuição para a segurança social
Pelo relatório anual de estatísticas do Observatório das Migrações, em 2022, os brasileiros lideraram as contribuições para o sistema previdenciário de Portugal entre os imigrantes. Os trabalhadores brasileiros aportaram quase 700 milhões de euros ao sistema, ou cerca de 40,5% do que foi arrecadado por estrangeiros para a Segurança Social naquele ano. Mesmo brasileiros que não têm título de residência contribuem para esse número, que inclui os impostos como IVA, embutidos nos produtos. Considerando-se apenas os brasileiros que já possuem título de residência, a porcentagem de contribuição chega a 115,3% - ou seja, até os que estão sem documentação e ainda assim colaboram para a Segurança Social. A contribuição é fundamental para contrabalançar as contas do sistema, oferecendo um relativo alívio ao sistema e ajudando a alcançar a sustentabilidade.
“Os imigrantes não apenas contribuem, eles são o ponto-chave para assegurar a sustentabilidade. Além de aportarem muito, utilizam pouco dos direitos que têm. A comunidade portuguesa vale-se muito mais dos apoios sociais, por ser mais envelhecida. Se não fossem os imigrantes, o saldo da Segurança Social não seria positivo” diz Ana Paula Costa, pesquisadora associada no Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) e Vice-Presidente da Casa do Brasil de Lisboa.
Também de acordo com o Observatório das Migrações, a contribuição ressalta que a imigração em Portugal é fundamentalmente orientada para o mercado de trabalho e produtiva. O que contradiz o argumento defendido em alguns países europeus de que a imigração tem como objetivo primordial maximizar os benefícios sociais e, consequentemente, sobrecarregar os cofres públicos dos países de acolhimento.
Empreendedorismo e trabalho
Ainda de acordo com os dados do relatório estatístico anual do Observatório das Migrações, os imigrantes mostram-se mais empreendedores do que os portugueses em geral e são importantes geradores de empregos para estrangeiros no país.
Os imigrantes brasileiros são líderes em contratações de estrangeiros, com 26,7% dos postos de trabalho gerados, ficando à frente dos chineses, com 16%. Além de empregar mais, os brasileiros apresentam maior diversidade de negócios que os chineses.
Os brasileiros lideram também em número de trabalhadores - 75.392 num total de 231.106. Também são os que mais fazem horas extras, com uma média de 17,2 horas por trabalhador. Segundo o Observatório das Migrações, a presença dos imigrantes é essencial para estabilidade econômica, pois é “claro que sem os imigrantes alguns setores económicos e atividades entrariam em colapso”. A maioria dos trabalhadores imigrantes estão concentrados em áreas em que a mão de obra é predominante, como os setores como a restauração, serviços e construção civil.
No ano letivo de 2021/2022, cerca de 19 mil brasileiros estavam matriculados no ensino superior português, o que representava 27,5% do total de alunos estrangeiros nas universidades. O estudo, aliás, foi o principal motivo para os pedidos de visto de brasileiros em Portugal em 2022, com um percentual de 38,2% do total. “Os programas de intercâmbio, como o Ciências sem Fronteiras criaram no Brasil essa cultura de ter uma experiência estudantil no exterior. Também a própria democratização do ensino superior no Brasil e o aumento de renda impulsionaram a vinda de brasileiros para Portugal. É claro que alguns estudantes podem vir e querer ficar, porque se identificaram com o país ou por querer trabalhar, mas muitos vêm como pesquisadores de curta duração ou com o projeto de estudar e voltar para o Brasil ou ir para outro país.” diz Ana Paula Costa.
São os imigrantes de nacionalidades que não fazem parte da União Europeia (UE) que ajudam a sustentar a estrutura das universidades de Portugal, porque pagam valores em propinas que podem ser até 10 vezes mais altos que os dos alunos portugueses. A tradicional Universidade de Coimbra é um exemplo. Enquanto os estudantes portugueses pagam mil euros de propinas por ano, os internacionais pagam em torno de sete mil euros.
Além do ensino superior, os brasileiros também se destacam no ensino básico e secundário. No ano letivo de 2021/2022, os alunos brasileiros representavam 50,7% do total de estudantes estrangeiros no sistema escolar de Portugal, com 41.764 crianças e adolescentes.
Brasileiros em números
615.000 brasileiros com título de residência em Portugal em 2023
67,6% dos imigrantes brasileiros têm entre 20 e 49 anos, 46,2% são homens e 53,8%
700 milhões de euros de contribuição para segurança social
26,7% dos estrangeiros empregados no país
19.000 estudantes no ensino superior
72% dos portugueses consideram os brasileiros os imigrantes mais bem integrados.