Com limpezas domésticas em Portugal, cearense monta própria empresa e fatura milhões
Ana Silva chegou a ter três empregos para garantir renda suficiente ao chegar em Portugal. Hoje, além das limpezas e consultorias, prepara o lançamento de um curso online e faz parcerias com associações de imigrantes, para ajudar na profissionalização dos recém-chegados.
Texto: Caroline Ribeiro
"Nos últimos cinco anos, faturamos quatro milhões de reais".
Ana Silva não esconde o orgulho que tem da própria trajetória. Talvez outros empresários, imigrantes, teriam certa restrição em apontar números, mas este não é o caso. "Tivemos um bom crescimento prestando serviço de limpeza doméstica. É isso que eu tenho que mostrar para as pessoas. Muita gente nem quer, sabe? Tem empresas que recusam pegar limpeza doméstica porque dizem que não paga bem. E paga muito bem. É uma questão de posicionamento, profissionalismo, de encontrar o cliente certo. Sou apaixonada por esse ramo", conta ao DN Brasil.
Para entender melhor como tudo aconteceu na vida da brasileira, vamos voltar a 2017. Na época, a cearense, natural da cidade de Quixeramobim, morava em Fortaleza. Formada em administração, era gestora do setor de RH de uma empresa. Tudo ia bem exceto por um ponto: Ana sofreu seis assaltos à mão armada, no Ceará e em outros estados onde viveu. Com uma experiência anterior de intercâmbio, de quando morou nos Estados Unidos para aperfeiçoar o Inglês, decidiu deixar o Brasil. "Portugal era uma das opções em que eu achei que seria mais fácil a adaptação, a questão do visto. Coloquei isso na cabeça e vim embora. Não tinha nenhum conhecido, nenhum contato".
Ao chegar, a cearense de deparou com uma realidade comum a muitos imigrantes: não encontrou colocação na sua área de formação. "Parece que no Brasil somos mais valorizados, a gente consegue ganhar melhor por ter um currículo, uma experiência em certa área. E isso aqui parece que é anulado quando a gente chega, a gente precisa começar do zero", lembra. Ana conseguiu emprego como corretora em uma imobiliária. Para complementar a renda, já que ainda não "não conseguia pagar as contas", recorreu a um segundo emprego como atendente de um restaurante.
Quando conseguia fechar o contrato de algum imóvel, Ana precisava garantir que tudo estava limpo para a entrega da chave ao cliente. "Quando eu ligava para as empresas, elas nunca tinham disponibilidade. Quando tinham disponibilidade, o cliente não gostava da qualidade do serviço. E aí eu fiquei com aquilo na cabeça, muitas das vezes entregar a casa a tempo, eu tive que limpar", diz.
Limpeza brasileira
A cearense resolveu formalizar com a chefe na imobiliária um acordo para que ela própria tratasse da limpeza dos imóveis. "Percebi que poderia fazer esse extra se fosse eu mesma limpando", conta. Assim, a rotina passou a ser ainda mais puxada. "Eu tinha três ocupações. Limpeza, imobiliária e o restaurante. Já não aguentava, estava super sobrecarregada. Falei com uma amiga que morava na minha rua, que trabalhava com limpeza, e ela passou a trabalhar comigo. Começaram a surgir outros clientes, que vinham de outras indicações e não só da imobiliária. Aí foi quando eu não consegui mais gerir e achei melhor, financeiramente, continuar com a empresa. Apresentei a demissão pra minha chefe e sai do restaurante".
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Menos de um ano depois de chegar em Portugal, Ana abriu a Maid to You, empresa especializada em limpezas domésticas "diferenciadas". O diferencial? "O detalhe da limpeza brasileira", afirma, além da qualidade dos produtos, todos do segmento sustentável. A brasileira conta que nunca teve dificuldade de clientes e entendeu que o maior problema seria encontrar mão de obra qualificada para executar as funções. "Há muita gente querendo trabalhar, há muita gente procurando, mas as pessoas não têm a qualidade para satisfazer o que o cliente quer ou o que o mercado exige. Tanto é que hoje eu dou consultoria para pessoas que queiram empreender na área", diz.
Ana ainda manteve a presença na execução das faxinas, mas a procura pelos serviços da empresa cresceu tanto que, logo em seguida, precisou parar. "Eu tinha que tratar da parte administrativa, entender sobre os impostos, sobre custos de funcionários, contratações. Fui tendo que contratar mais pessoas, contratar em diferentes regimes, efetivo, part-time, prestadores de serviços".
Hoje, além das limpezas e consultorias, Ana prepara o lançamento de um curso de engomadoria online, "ramo que tem carência de profissionais e muita demanda", diz. A brasileira também faz parcerias com associações de imigrantes, para dar cursos e ajudar na profissionalização dos recém-chegados. "Tem gente até que diz: 'você está abrindo concorrência'. Não é, porque, inclusive, eu fico feliz quando eu vejo uma empresa pequenininha crescendo. Vou ajudar as pessoas a passarem de forma mais fácil pelo percurso que eu passei, que foi tão difícil".
caroline.ribeiro@dn.pt