Brasileiros levam arte de rua às noites de Natal em Lisboa
Decoração no centro da capital tem a companhia da banda sonora de músicos vindos do Brasil. Mesmo com ruas tomadas por visitantes, movimento - e rendimento - é bem menor do que no verão, dizem.
Texto: Nuno Tibiriçá
Se por um lado o frio aperta, por outro o surpreendente céu azul que se faz em pleno dezembro em Lisboa ajuda que as performances dos artistas de rua no centro da cidade sigam prestigiadas nesta época do ano. Seja no Largo de Camões, no Rossio, ou nos miradouros de São Pedro de Alcântara e do Adamastor, o visitante que caminha pela Baixa admirado pelas decorações de Natal se depara com artistas de música, dança ou outros formatos artísticos que chamam a atenção do público na região.
Os protagonistas vêm de diferentes países, como Inglaterra, Holanda, Argentina e Senegal, mas há uma nacionalidade que está mais representada no meio: a brasileira.
“Tem gente de todos os cantos, mas não tem como: o Brasil domina, somos muitos aqui, temos até um grupo de artistas de rua brasileiros, vamos dando dicas de onde está bom para tocar, onde não está. Tem um senso de parceria muito grande entre nós”, comenta ao DN Brasil o músico Tulio Garcia, natural de Franca (SP), que vive em Portugal há cinco anos, três destes dedicados à arte na rua.
Cantando para um público animado no Rossio antes de atender a reportagem do jornal, Tulio conta que nos meses de inverno é preciso se desdobrar para conseguir fazer o trabalho render: para fazer o dinheiro que consegue em dois ou três dias no verão, é preciso trabalhar praticamente todos os dias da semana no inverno.
A diferença, neste ano, no entanto, tem sido acentuada pelo grande movimento no centro da cidade. “Acho que esse ano as ruas estão mais decoradas, tenho sentido mais desse espírito natalino e o pessoal tem sido muito solidário. Ano passado, por exemplo, não teve tanto movimento quanto estou vendo esse ano, tenho a impressão que capricharam mais na decoração e isso tem atraído mais gente para cá. Já tive dias maravilhosos de trabalho nesse inverno, mas claro que não se compara com o verão”, revela o paulista, que analisa que, em média, os rendimentos da época alta do ano são praticamente o dobro do que é feito nos meses de inverno.
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Em outro ponto da Baixa de Lisboa, mais precisamente em frente ao famoso café A Brasileira, nas proximidades do Largo de Camões, outros artistas de rua fazem fila para performances e são fotografados e filmados por quem ali anda. Kleuton Barros, que nasceu em Serra (ES) e vive em Portugal desde 2008, é um destes artistas. Há um ano fazendo shows na rua, Kleuton conta que já passou por diversas áreas de serviços tanto em Portugal quanto em outros países da Europa até decidir seguir o sonho da música.
“Já tinha gravado alguns discos quando tive outros trabalhos, mas só consegui que virasse mesmo o meu ganha pão nos últimos tempos. É o que gosto de fazer e é melhor que muito trabalho convencional em Portugal, consigo me sustentar mesmo nesse período mais baixo”, afirma o capixaba.
Segundo Kleuton, mesmo conseguindo o sustento, o impacto da época baixa é grande. “Para se ter uma ideia, diminui os rendimentos em 70%, diria. É uma diferença grande. Fora que mesmo para tocar o instrumento o frio dificulta”, comenta Kleuton após terminar o seu show de fim de tarde com “Por Enquanto”, de Cássia Eller, que rendeu aplausos de turistas, portugueses e brasileiros saudosos que passavam pela Baixa.
Aliás, se não passam despercebidos pelo público que anda pelo centro de Lisboa, os artistas também são reconhecidos pelos próprios profissionais da música e nomes consagrados no cenário brasileiro e internacional. Em outubro, quando a artista de rua brasileira Mariana Mug cantava na região, ela avistou membros da banda Detonautas, que estavam em turnê por Portugal e começou a cantar um dos hits do grupo. Os integrantes se juntaram à cantora e depois convidaram Mariana para participar de um dos shows em Lisboa. “A Mariana representa todos os artistas brasileiros em terras lusitanas”, declarou Tico Santa Cruz, membro da banda no palco da apresentação naquela ocasião.
Seja no verão ou no inverno, tocando para um turista ou até para um ídolo, os brasileiros que se apresentam na Baixa de Lisboa tem uma certeza. O público que para os ouvir é especial. Para Tulio, um trabalho pelo qual é grato, especialmente em Portugal. “Sinto que as pessoas aqui apreciam e valorizam muito a arte. É sempre um desafio tocar na rua todos os dias, mas essa gente aqui nos dá muita motivação para isso”, finaliza o brasileiro após receber mais uma gorjeta e elogios de uma senhora portuguesa mesmo passados bons minutos de sua apresentação.
nuno.tibirica@dn.pt
Este texto está publicado na edição impressa do Diário de Notícias desta segunda-feira (23).