Brasileiras dominam o palco na segunda noite do MIMO Festival
Imigrante brasileira Ákila foi destaque da noite.
Texto: Amanda Lima
A diversidade de gênero, cores, idades e corpos marcou a segunda noite do MIMO em Amarante ontem. Mesmo com chuva e alterações de última hora no cartaz por causa do “apagão informático”, que impediu a viagem de alguns artistas, o público novamente compareceu em peso no Parque Ribeirinho.
As apresentações no palco começaram com a artista brasileira Simone Mazzer, que deu destaque para as canções do álbum Deixa ela falar. A cantora define a obra como uma defesa da liberdade dos corpos. As músicas criticam o padrão corporal imposto pela sociedade e brinda a diversidade de corpos, especialmente das mulheres, com um discurso de combate à gordofobia.
O segundo concerto da noite foi da artista transgénero Ákila, que começou a vida artística com o nome de Puta da Silva. A imigrante brasileira vive em Portugal há sete anos e está em ascensão na carreira, sendo o MIMO um dos maiores palcos em que já atuou.
Com emoção em alguns momentos, Ákila performou um show poderoso, acompanhado de uma afinada banda e um habilidoso casal de dançarinos, todos negros. A artista cantou clássicos brasileiros como Maria Mariá e Polícia, além de trabalhos autorais como Hétero Curioso e Bruxona, que o público demonstrou conhecer cantando em coro.
O concerto também foi diverso em si mesmo. Em alguns momentos, sobressaiu os acordes de guitarra em ritmo de rock’n’roll, e, noutros, um sensual e romântico saxofone ou os acordes de capoeira, um esporte de origem africana que mistura artes marciais e dança. Na primeira parte da apresentação, a artista vestia uma roupa toda preta e botas de estilo militar. Na segunda parte, voltou com um grande chapéu, botas até o joelho de salto alto e um vestido vermelho vivo.
O que não mudou durante a apresentação foram as poderosas mensagens políticas, em defesa das pessoas trans, dos imigrantes e afrodescendentes. As bandeiras já são marcas da artista, que pode ser considerada uma revolucionária em Portugal: passou de uma artista de rua até aos grandes palcos do país, além de ser a primeira atriz trans a estar numa novela portuguesa (Cacau, da TVI). Ákila agradeceu diversas vezes aos espectadores e destacou o quanto isso é revolucionário. “Olha quanta gente veio ver a artista travesti”, celebrou.
Após 1h30 de concerto, a brasileira encerrou sob gritos e aplausos com duas bandeiras: uma do Brasil e outra de Portugal, a pedir para o público repetir o refrão O amor será eterno novamente.
Na sequência, em mais uma mostra de diversidade do MIMO, foi a vez de Rita Benneditto, de 58 anos. Vinda diretamente do estado do Maranhão, a brasileira foi mais uma presença poderosa no palco. O concerto, batizado de Tecnomacumba, misturou religiosidade, trabalhos autorais e clássicos da Música Popular Brasileira (MPB), como Gilberto Gil e Caetano Veloso.
A chuva insistia em cair devagar, o que não fez o público sair. Durante toda a apresentação as pessoas cantaram e dançaram animadas. Foi assim também no concerto seguinte da noite, com o grupo Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro do Brasil. A apresentação no MIMO fez parte das celebrações dos 50 anos de carreira dos artistas, que, além da música, possuem um discurso político de justiça racial.
O concerto foi uma explosão de cores e batuques poderosos que seguiu madrugada adentro. O Ilê Aiyê volta ao MIMO neste domingo para um cortejo no Largo de São Gonçalo, às 18h. O festival chega ao último dia com um cartaz diverso, que traz o português Dino D’ Santiago e Femi Kuti & The Positive Force, da Nigéria.
A noite de ontem teria a apresentação de Fatoumata Diawara, do Mali, porém, o grupo não conseguiu viajar por causa da pane informática de sexta-feira. A organização do MIMO já os confirma como a primeira presença confirmada da edição 2025, que terá lugar novamente em Amarante.
amanda.lima@dn.pt
(A jornalista viajou a convite do MIMO)