Falsos agendamentos, moradia fantasma e mais: advogada lista golpes comuns em Portugal
Ao DN Brasil, Helenara Avancini, especialista em Direito dos Estrangeiros e Imigração, revela alguns casos para ter atenção ao se mudar para o país.
Texto: Nuno Tibiriçá
Mudar de país requer muita pesquisa, planejamento e atenção, especialmente em tempos nos quais, por vezes, é difícil identificar o que é um golpe e o que não é. Em Portugal, existem muitos grupos em redes sociais com milhares de brasileiros, dentre os quais se encontram um ou outro que se propõe a "ajudar" um imigrante que pensa em se mudar para cá ou já vive no país.
Convém pontuar que, muitas vezes, no entanto, essa ajuda pode não ser bem o que você espera. Ao DN Brasil, a advogada brasileira residente em Portugal e especialista em Direito dos Estrangeiros e Imigração, Helenara Avancini, listou alguns dos golpes que costuma testemunhar por aqui. Confira.
Apartamentos fantasmas
Foi há pouco menos de um mês que Helenara ajudou um cliente que quase caiu em uma roubada daquelas. Ainda no Brasil, ele conseguiu um negócio dos sonhos com um apartamento em Portugal: tinha conseguido um T4, com todas as contas incluídas, garagem e outros benefícios, por €1000. Estava tratando de outras questões com a advogada e comentou sobre a sorte que teve com o aluguel, que havia encontrado em um site através de um grupo do Facebook. Helenara prontamente desconfiou.
"Achei muito estranho o valor pelo que ele estava me descrevendo e pela localização, em Leiria. Pedi para me enviar e realmente, tinha ali um site bem estruturado, uma empresa, pensei que ou aquilo era mesmo um ótimo negócio, ou tinham um refinamento para golpe impressionante", relembra a advogada. Foi o caso.
Ainda com o pé atrás, Helenara foi procurar a empresa, que tinha sede em Lisboa, apesar do imóvel em questão ser em Leiria. Ao chegar, viu as casas disponíveis para alugar e nada da que havia sido referenciada pelo seu cliente. Quando um funcionário chegou à pequena loja, foi questionado por Helenara e, afinal, o imóvel não existia. Uma pessoa estava se passando pelo mediador da empresa, com assinatura de email, site pirateado e mais pormenores.
Para evitar uma situação dessas, algo que pode ser normal por se tratar de golpes tão bem elaborados, a dica da advogada é simples: evitar fazer negócios à distância.
"Se ainda estiver por vir, alugue um Airbnb, um quarto de hotel, algo para uma curta estadia num primeiro momento, o prejuízo será menor que cair em um golpe, garanto", ressalta a advogada que, pelos casos que já teve, afirma que cair nesse tipo de golpe não é uma exclusividade de quem ainda não se mudou.
"Isso serve para quem está em Portugal também: muitas vezes existem supostas agências que tratam de todo processo de aluguel online. Algumas são até legítimas e este é o método que funcionam (é o caso da Imovirtual, por exemplo). Mas, por via das dúvidas, visite sempre um apartamento antes de fechar negócio. Por razões simples, desde segurança para saber que é legítimo, até mesmo para conhecer onde vai morar. Vai que não gosta da rua, da iluminação?", diz Helenara.
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Falsos agendamentos
Outro golpe comum em Portugal e que Helenara já se deparou várias vezes também surge normalmente nos tais grupos de redes sociais: os falsos agendamentos na AIMA ou em outros órgãos de serviços portugueses. Segundo a advogada, não poucos os brasileiros e imigrantes de diferentes países que se dirigem à AIMA com um agendamento feito através de um "intermediário" e, ao chegar ao balcão, são informados que não tem nada marcado.
"Chegam a cobrar um balúrdio, 200, 300 euros. Outro dia mesmo estava na AIMA e uma senhora que havia vítima desse golpe estava reclamando com a funcionária, que só disse: 'você tem que reclamar com a pessoa que te cobrou'. Tinha razão. O desespero causa isso, os serviços em Portugal não vem funcionando bem, todos sabemos. Mas esse tipo de processo não pode ser tratado com alguém que conheça na internet, por mais que pareça legítimo", afirma.
Mais uma vez, Helenara refere que quem aplica esse tipo de golpe sabe bem como estruturar, dando a entender que é de uma empresa especializada em agendamentos. "Para quem acabou de chegar no país, não conhece a estrutura e as leis locais, o funcionamento dos serviços aqui, acaba por ser um golpe relativamente fácil de cair", lamenta.
Furar a fila da nacionalidade
Nos últimos tempos, os processos para obter a cidadania portuguesa tem demorado entre 18 e 24 meses. Com dezenas de milhares de pedidos na fila de espera, o site da Nacionalidade Portuguesa quase que semanalmente cai, aumentando a agonia daqueles que esperam pelo documento. É aí que surge, não um golpe, segundo Helenara, mas uma espécie de "pilantragem".
Alguns advogados se oferecem a "acelerar o processo" da cidadania, indicando aos potenciais clientes que tem acesso a uma lista de urgência. No entanto, a advogada explica que se encaixar na categoria de urgência para conseguir a documentação só é possível em raros casos.
"Quem está aqui amnistiado, como pessoas que vieram da Ucrânia, que vieram fugidas do país e precisam se regularizar, questões de saúde grave também... portanto são exceções. E mesmo nesses casos, ainda precisa passar pelo crivo interno depois, é um processo complicado. Não dá para garantir que é possível colocar o cliente na fila de espera e tem quem cobre €1500 euros para isso", revela.
Para Helenara, nesses últimos casos, a pressa pode ser inimiga, não só da perfeição, mas também do bolso. Portugal, como todos nós sabemos, testa a paciência dos imigrantes no processo burocrático e não há muito mais a fazer, se não aceitar que esta é a realidade no país.
"Infelizmente, não tem o que fazer. Como disse a respeito dos agendamentos, para a cidadania a mesma coisa: os serviços não estão funcionando bem e não vemos uma perspectiva breve para que melhore. É triste, mas tem que ter paciência mesmo, não tem outro jeito" finaliza.
A advogada Helenara Braga Avancini está em Portugal desde 2013 e é especialista em Direito dos Estrangeiros e Imigração
nuno.tibirica@dn.pt