Opinião. O que é "via verde" para o construção civil? Um santo pra descobrir outro?
"Lembram da via verde para os atletas? Colocar em prática o art 123 da lei 23/2007 com a finalidade de atender a um lobby específico dos clubes de futebol, numa época pré-jogos, e os demais imigrantes com situações urgentes, a gente joga para debaixo do tapete"
Texto: Priscila Nazareth Corrêa
Falando em economia doméstica, toda dona de casa que se preze sabe gerir sua despensa e suas atividades da semana. Planeja o cardápio, vê o que falta para os pratos a serem feitos, e ainda os equaciona com as promoções da semana, acompanhando os encartes do mercado. Sabe o dia de faxinar o banheiro, o dia do aspirador, o dia da limpeza da geladeira e cozinha, e assim organiza sua vida familiar e doméstica, e ainda organiza o tempo dos passeios em família.
O exemplo parece insólito comparado à governança de um país, mas não é.
Com respeito às devidas proporções e situações diferentes, gerir as necessidades de um país pode ter muitas semelhanças com a vida doméstica. E nisso o nosso governo peca. Falemos da proposta da via verde dos empregados da construção civil. A alegada via mais rápida com a garantia de cobertura da moradia aos imigrantes tão necessários à essa área da economia.
Lembremos que a ausência de oferta de casas tem causa multifatorial. Mas é certo que com quase 70% de senhorios a sonegar impostos, o mercado imobiliário vive um faroeste. A quem caberia fiscalizar? O Governo.
Da mesma forma que o licenciamento de novos projectos de construção demorar 3 ou mais anos junto às câmaras municipais favorece à corrupção e impede o aumento do parque habitacional, igualmente problemático é a alteração do PDM, que define "quais" terrenos estão ou não livres para construção urbana, isso sempre atendendo a certos interesses, em desvalorizar uma região e depois impulsionar a especulação imobiliária quando os tais terrenos estão nas mãos dos grupos certos. Quem é o responsável direto por essa vergonha? De novo o Governo.
Adianta querer que o empresário se responsabilize pelo alojamento quando a falta de moradia decorre de problemas outros como os acima descritos? Parece-me tudo uma cortina de fumaça. Lembram da via verde para os atletas? Colocar em prática o art 123 da lei 23/2007 com a finalidade de atender a um lobby específico dos clubes de futebol, numa época pré-jogos, e os demais imigrantes com situações urgentes, a gente joga para debaixo do tapete.
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E falemos dos estudantes, estamos no fim de Dezembro, há mais de 2 meses que as aulas tiveram início e há centenas de estudantes com propinas pagas, a financiar universidades portuguesas sem nunca ter assistido um dia de aula, justamente porque o consulado não responde aos pedidos de visto, alguns que ultrapassam 6 meses de atraso. Quem deixa de equipar o consulado com os funcionários necessários ao exercício do trabalho? O Governo, atraso com essa promessa a mais de meio ano. E já adiantou que essa medida não se inicia antes do primeiro trimestre do próximo ano.
Infelizmente o estudante não está visado no Plano de Recuperação e Resiliência, o conhecido PPR, financiado pela União Europeia, ou seja, dele não se depende do dinheiro que Portugal recebe para adotar as práticas de qualidade social e económica exigidas pelo bloco. Se assim fosse podem ter certeza de que se arranjaria uma "via verde" para esses também.
Mas o lobby para educação nunca poderá ser comparado ao lobby da indústria.
Bom, meus caros, vamos aguardar a chegada das iniciativas dos lobbys da agricultura para os vistos sazonais, ou o lobby do setor turístico quando a primavera estiver no fim, e o verão à nossa porta!
Se o governo não segue a lição da boa dona de casa, que planeja seu orçamento e suas tarefas, será sempre um apagar de incêndios de quem "grita" mais, ou sendo mais direta, de quem tem mais poder de fazer pressão economica e social.
Enquanto isso, o imigrante comum continua à espera do agendamento do reagrupamento de sua família, da renovação de seu título caducado, e, para quem é CPLP permanece encarcerado em Portugal com residência vencida diante dos demais países.
Pior do que não apresentar soluções concretas é deixar claro à população imigrante que o que é feito só atende ao interesse de "alguns".
Permaneçam atentos e usem suas vozes para fazer o barulho necessário a que TODOS os imigrantes tenham direitos iguais.
Dra. Priscila Nazareth Corrêa - Advogada Especialista em Direito Internacional Privado, sempre alerta na proteção do Direito dos imigrantes, sejam eles quem forem.